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O momento do Sul Global: oportunidades para a presidência brasileira no G20

A nota intitulada “O momento do Sul Global: oportunidades para a presidência brasileira no G20”, de autoria dos pesquisadores Bruno de Conti, Pedro Rossi, Arthur Welle e Clara Saliba, foi produzida em parceria entre o Made – Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades, da USP, e o Projeto Transforma, do IE-Unicamp. A nota destaca três temas principais que são centrais para a presidência brasileira no G20: a importância crescente do Sul Global, as desigualdades no Sistema Monetário e Financeiro Internacional (SMFI) e as oportunidades específicas para a liderança brasileira no grupo.

Desde a criação do G20 em 1999, os países do Sul Global têm aumentado significativamente sua importância econômica e demográfica dentro do grupo. Atualmente, esses países igualaram o Produto Interno Bruto (PIB) em paridade de poder de compra (PPP) dos países do Norte, representando 86% da população do G20, com uma parcela significativa de jovens, o que indica um potencial de crescimento futuro. Além disso, a participação do Sul Global nas exportações do G20 cresceu de 13% em 1999 para quase 40% em 2022. Em termos de produção de eletricidade, os países do Sul Global ultrapassaram os países do Norte em 2013, produzindo hoje mais de 40% da eletricidade mundial. Essa crescente importância é reflexo de um esforço coletivo que inclui a expansão econômica de países como China, Índia e Brasil, e uma maior articulação entre os países do Sul Global, exemplificada pela ampliação dos BRICS.

Apesar desses avanços econômicos, a nota destaca que as mudanças no Sistema Monetário e Financeiro Internacional (SMFI) têm sido mais lentas. O dólar norte-americano continua dominando as transações cambiais globais, criando um desequilíbrio que favorece os Estados Unidos e impõe restrições aos países do Sul Global. Este desequilíbrio monetário confere aos Estados Unidos um “privilégio exorbitante” e impõe um “fardo compulsório” aos países emissores de moedas periféricas, limitando sua autonomia econômica. A reforma do SMFI é vista como crucial para reduzir essas assimetrias. Atualmente, a única moeda emitida pelo Sul Global que teve uma ascensão significativa é o renminbi chinês, mas outras moedas importantes, como o real brasileiro e a rupia indiana, permanecem marginalizadas no cenário internacional.

A presidência brasileira no G20 tem a oportunidade de promover reformas que reduzam essas assimetrias e de focar em três eixos prioritários: combate à fome, à pobreza e à desigualdade; transição energética e desenvolvimento sustentável; e reforma do sistema de governança internacional.

A inclusão da União Africana como membro permanente do G20, iniciada na cúpula de New Delhi em 2023, é um passo significativo na ampliação da representação do Sul Global. No entanto, a nota ressalta que a governança global ainda reflete uma ordem forjada no pós-Segunda Guerra Mundial, que não responde adequadamente aos desafios atuais.

Além de reformar o SMFI, a presidência brasileira pode aproveitar a oportunidade para fortalecer iniciativas de alívio ou perdão de dívidas dos países do Sul Global. A Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI), lançada em 2020, e seu sucessor, o Quadro Comum para o tratamento da dívida, mostraram-se insuficientes. A nota defende a criação de mecanismos mais eficientes para lidar com o endividamento externo e os custos do financiamento climático, essenciais para a realização de investimentos em mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

A análise dos relatórios do G20 desde 2008 revela uma crescente ênfase em temas como desenvolvimento, saúde, educação e desigualdade de gênero, refletindo a influência do Sul Global. No entanto, a transição energética permanece uma questão urgente. A produção de energia limpa é equivalente entre Norte e Sul Global, mas o uso de carvão mineral ainda é predominante nos países do Sul. A presidência brasileira tem a oportunidade de liderar a transição energética global, promovendo parcerias e financiamentos que permitam uma transição rápida e socialmente justa. Além disso, a agenda de redução das desigualdades de gênero e raciais precisa ser aprofundada, garantindo a transversalidade dessas questões em todas as iniciativas do G20.

 

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