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Justiça Tributária para acabar com a lacuna de financiamento climático

Por Grazielle Custódio David, doutoranda em desenvolvimento econômico na Unicamp, pesquisadora do Transforma.

Em apenas 2 meses, novembro de 2025, o Brasil sediará o maior evento global de enfrentamento à crise climática, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas – COP30, em Belém do Pará. Esse evento é realizado anualmente, e o último ocorreu em Baku, onde ficou evidente a lacuna entre os compromissos assumidos pelos países de ação para enfrentar a mudança climática e as formas que financiarão esses compromissos, especialmente nas ações que devem ocorrer nos países de economia periférica.  Ativistas climáticos são enfáticos em afirmar que os países falharam em avançar, o que coloca grande expectativa de que os acordos para suprimir a lacuna de financiamento climático sejam alcançados na COP30 no Brasil. 

Estimativas trazidas pelo IPCC (2024) indicam uma lacuna anual de aproximadamente US$ 2.4 trilhões para mitigação climática e US$ 400 bilhões para adaptação até 2030, totalizando US$ 2.7 trilhões. Ainda, a Oxfam (2023) estima que são necessários US$ 1.3 trilhões para financiar a transição justa no Sul Global. Os países do Norte Global alegam que seus orçamentos estão muito limitados lidar com os custos de financiamento para o Sul Global, entretanto essa crise climática é fruto desses mesmos países, de seus super ricos e grandes corporações, e devem assumir a responsabilidade pelo desastre climático que causaram.

A Oxfam (2024) calcula que cerca de uma década das emissões de investimentos dos 50 bilionários mais ricos do mundo (entre 2018 e 2028) causará US$ 250 bilhões em prejuízos econômicos até 2050. Isso equivale à produção econômica atual de países como Equador e Bulgária. E os prejuízos econômicos que os países de baixa e média renda já acumularam entre 1990 e 2023, devido a três décadas de emissões de consumo do 1% dos super-ricos do mundo (1990-2019), representam cerca de três vezes o total de financiamento climático oficialmente registrado que os países desenvolvidos concederam aos países de baixa renda. Vivemos em um só planeta e os efeitos da crise climática não serão sentidos somente nos países que não têm recursos financeiros, serão sentidos por todos, tornando a responsabilidade de financiamento uma obrigação de todos e para com todos, especialmente daqueles que mais poluíram e seguem sendo os maiores poluidores.

E existem possibilidades de ampliar os orçamentos de todos os países de maneira justa para as pessoas e o planeta. Uma maneira muito efetiva é fazer com que tem mais e quem polui mais, contribuam mais com impostos: imposto à riqueza e com acréscimo sobre ativos advindos de atividades prejudicais ao meio ambiente, impostos às super rendas e com o acréscimo ambiental, impostos aos lucros extraordinários de corporações e como o acréscimo ambiental, revisão dos subsídios aos combustíveis fósseis e de outros setores econômicos com amplo impacto socioambiental.

A Tax Justice Network (2025) publicou um estudo demonstrando que as principais causas da lacuna de financiamento climático estão no enfraquecimento da soberania tributária dos países devido ao abuso fiscal por parte de super ricos e grande corporações. O relatório conclui que é possível os países arrecadarem imediatamente US$ 2,6 trilhões anualmente, se adotarem um imposto mínimo sobre a riqueza de 1,7% a 3,5% sobre as famílias que compõem o 0,5% mais rico e recuperando os impostos corporativos não pagos por empresas multinacionais que transferem seus lucros para paraísos fiscais. 

Mais uma vez o Brasil tem um rol protagonista nessa oportunidade e necessidade de tributação. Durante sua presidência do G20 em 2024, o Brasil avançou a importante agenda de tributação dos super ricos, assim como na sua presidência do BRICS em 2025, levando diversos países a concordarem em avançar esse compromisso. Nacionalmente, o Brasil também está agindo com o PL 1087/2025 que visa isentar do imposto de renda pessoa física quem tem renda até R$ 5.000 e compensar cobrando uma alíquota mínima de 10% dos super ricos, que representam apenas 141 mil brasileiros, e que hoje contribuem com apenas 2,5% de imposto de renda, enquanto trabalhadores de renda média já contribuem com uma alíquota efetiva que chega até a 15%. Ainda, no processo de construção da Convenção Marco de Cooperação Tributária das Nações Unidas, o Brasil junto com outros países da América Latina, especialmente aqueles que estão na Plataforma Tributária da América Latina e Caribe, têm sido lideranças na defesa de acordos internacionais para tributação dos super ricos e para que a cooperação tributária internacional garanta os direitos humanos, onde estão incluídos os ambientais. A Convenção Tributária da ONU é ampla e também tem se dedicado a buscar mecanismos de tributação internacional efetiva e justa de multinacionais e a promover a tributação ambiental, entre outros temas. É nesse contexto de crise climática e do multilateralismo global, mas também de oportunidade de novos processos, que diversas entidades (Instituto de Economia da Universidade de Campinas (UNICAMP), Inesc, Observatório Brasileiro do Sistema Tributário, Red de Justicia Fiscal de América Latina y el Caribe,Transforma e Tax Justice Network) se juntaram para organizar a Conferência “Um clima para a mudança: rumo a uma tributação justa para o financiamento climático” nos dias 13 e 14 de outubro de 2025, na Unicamp, com a participação de outras diversas organizações, especialistas, acadêmicos, movimentos sociais e representantes do governo que organizam a COP-30, para pensar e construir em conjunto propostas a serem levadas para a COP-30, que ocorrerá no mês seguinte. Junte-se ao Transforma nesse evento e na busca por justiça tributária para acabar com a lacuna de financiamento climático.

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